A minha infância foi um deleite de aventura, brincadeiras, jogos, ao menos a
parte que agora lembro com mais saudade e dos melhores momentos.
Eu lembro de três lugares especiais e duradouros nos quais era gostoso ser
criança, ter todas as horas do dia pra simplesmente brincar, descobrir o mundo e me
divertir.
O primeiro deles é o sítio dos meus pais em Jaçanaú, localidade antes de chegar
em Maranguape, passei 6 meses morando com minha família lá nos meus 12 anos,
eu acho, enquanto minha casa aqui em Fortaleza estava totalmente em reforma. Eu
diria que não há coisa mais gostosa em ser criança num sítio com lagoa e vizinhos
da sua mesma idade, com bicicleta, pescaria, banho de lagoa, passeio de barco e
principalmente com segurança, coisas ruins do tipo assalto, seqüestro nem passavam por
nossas cabeças. Era liberdade total. Sou a caçula dos filhos e acompanhar meus irmãos
sempre foi um desafio, e a coisa que mais recordo como incrível foi quando a lagoa
que é bem grande estava seca, mas bem seca, pois quando se olhava pra ela era aquelas
cenas de seca braba do Nordeste mesmo, a terra toda rachada, às vezes uma lama, e daí
apareciam coisas que foram perdidas na lagoa. Nesse cenário de seca, eu, meus dois
irmãos e os três vizinhos (meninos por sinal) fomos desbravar aquele cenário na longa e
instigante caminhada de arrudiar toda a lagoa, nossa! Foi muito massa, primeiro a gente
andava e o chão se craquelava cada vez mais, daí a gente ia andando e olhando tudo que
a água encobria, as pedras, torras de madeira no fundo, meu irmão nerd, rs, até fez um
mapa da lagoa. A gente via, objetos perdidos, peixes mortos, e fez por outra um de nós
afundava o pé, achando que a terra tava firme, mas era pura lama. Isso a gente fez uma
vez só, deve ter demorado umas 3hs, bastou uma vez mesmo e foi massa!
Outro local significativo pra minha infância foi a casa dos meus avós maternos
no bairro Nova Assunção. Seguinte eu sempre morei na mesma casa a vida toda,
ainda moro nela, e quando era criança tinha notícias que alguns amigos se mudavam,
e eu sempre quis me mudar, não pelo fato de não gostar da minha casa ou da minha
vizinhança, mas porque eu achava que seria muito massa arrumar tudo, empacotar, daí
chegar numa casa totalmente vazia e começar a preenche-lá. Bem, daí ir pra casa da
minha avó era especial, domir uns dias lá (quando meu irmão teve catapora, daí eu e
meu outro irmão fomos pra casa da vovó), era diferente, sabe? E o diferente era muito
massa, a porta principal da casa é daquelas bem grande, dupla porta de madeira com
venezianas, então quando abria de manhã era aquela claridade boa das 6hs, daí a mesa
das refeições era esse primeiro cômodo iluminado, que tinha vista pruma área da frente
da casa com plantas e com uma cisterna.
A minha avó sempre foi uma cozinheira de mão cheia, esses foram os quitutes
na mesa de café: tapioca de tabuleiro, canjica, mucunzá salgado, doce de banana,
buchada. Mas do que especificamente só tinha na casa da minha vó era: café Nescafé,
suco de maracujá da fruta (sabe aqueles carocinhos pretos da semente triturada?) e
lambedor (tomávamos direto quando estávamos gripado e era ela que comprava aquelas
13 ervas e fazia).
Acho que eu adoro o sabor de coisa nova, tipo o café da casa da vovó era muito
massa pq era Nescafé, sabe? O cheiro era diferente o modo de preparo tb, você que
media na sua colher e preparava. Daí depois de tomar café, certamente eu ia pro quintal
da vovó onde tinha uma pastor alemã amarela (que eu não tinha muito medo, hehe,
eu entrava no quintal, mas pra sair era difícil pq a cachorra ficava ali colada pra entrar
dentro de casa, daí tinha que uma pessoa segurar ela lá pelo outro portão), tinha um anel
de cacimba cheio de peixes ornamentais que a vovó vendia pra meninada do bairro, daí
a gente ficava com aquelas redinhas caçando os peixes, há fora esse anel a vovó tinha
um grande aquário que ai sim dava pra ver todas os tipos e cores de peixes.
A casa da minha vó era diferente, o quarto dela (que não mostrei pra vcs na
visita pq tava trancado e não me lembrava da importância dele) tinha o chão todo de
carpete, e a colcha de cama sempre feita por retalhos (costura e culinária: referência
à minha avó) o quarda-roupa marromzão era a parede toda do quarto e as portas eram
todas iguais, mas uma levava pro banheiro, o banheiro era num nível mais baixo e
tinha bidê, eu adorava limpar a xereca com água (kkkk), acho que era de azulejos todos
azuis... E tinha uns mosquitinhos inofensivos que só existiam lá na casa dela, mas eram
tipos mosquitinhos de banheiro. A minha memória afetiva perpassa muito por cores, a
casa da minha vó é referência de cores e de cheiros... cheiro de café, de água de aquário
e de retalhos por exemplos.
A porta que dava passagem pra cozinha era muito massa de madeira branca
vazada e tipo porta de filmes bang-bang, tipo de cozinha mesmo sem maçaneta, nem
tranca. O momento do café da tarde era esticado, enquanto tios(as) e avôs e mãe
jogavam baralho (referência estética) os netos se divertiam pela casa.
E pelo bairro da minha vó eu fiz balé, jazz e catecismo, lembro que íamos
sempre a pé, e era até distante, agora vejo que ainda existe a mesma academia de balé/
jazz há 1 quarteirão, e a Igreja de Nossa Sra de Assunção há 4 quarteirões.
Saia com minha vó pra comprar ervas na feira, ração pros peixes, comida pros
periquitos australianos, e esse outro mundo da rua e seu comércio também era
fascinante.
O terceiro local feliz e significativo da minha infância, foi minha rua, meu
bairro. Eu passava a tarde e noite no “meio da rua”, só voltava pra casa pq meu pai
gritava do portão ameaçando me bater, e eu voltava bem sujinha mesmo, pés pretos e
morria de preguiça de tomar banho, quantas vezes dormir com os “pés pretos”, rs.
Tudo que foi brincadeira eu brinquei: pega-pega, jou ajuda, 7 pecados, carimba,
vôlei, carrinho de rolimã, patins, fiz pipa “bolachinha”, eu também era meio menino, pq
tava sempre em companhia de meninos, meus dois irmos e o gato do vizinho, hehe, ele
era lindo, Walace, mas eu era muito pequena era só contemplação mesmo.
E junto com meus irmão, dentro de casa, tínhamos LEGO, Atari, Máster System,
War, muitos outros jogos de tabuleiro, deve ser por isso que eu amo jogos hoje em dia,
e também tive um irmão curioso, imaginativo e criativo que bolava pra todos garotos da
rua Casa do Terror e dublagens de vídeos (um pouco mais tarde). Lembro das febres
dos brinquedos e supérfulos: correntinha de clipes coloridos de plástico, coleção de
papel de carta, pulserinhas de hippies que a gente mesmo fazia com tábua de madeira,
pregos e linhas de crochê coloridas. Lembro que bebi álcool achando que era água pq
meu irmão cientista queria ver um gelo pegar fogo, lembro que ele tb queimou uma
tábua de madeira escrevendo nela com lupa através do Sol, lembro que quebrei a perna
com 11 anos (acho) era um domingo à noite e eu frescava com um bêbado na calçada
junto com umas colegas, a gente chegava perto do bebo dizia algo se assustava e corria,
daí caí de mal jeito, 6 meses de gesso e muitos kilos a mais.
Infância anos 80 né? Sensacional... a tia da minha amiga trazia muambas do
Paraguai e a gente ia pra casa dela fascinada ver... Corri muito e me ralei demais, andei
de bicicleta e cai também, lembro da rua de calçamento ainda e eu tinha ganho uma
bicicleta com cestinha, fui inaugura-la comprando o pão de manhã, pão naquela época
só era pão bengala sabe? E não tinha saco, era só aquele papel de pão um pedacinho
enrolado no meio onde se pegava, eu botei o pão na cestinha e antes de chegar em casa,
rs, ele caiu no chão, no calçamento, na areia, acho que não comi pão naquela manhã e
também não contei, hehe.
Minha infância em casa foi meio “bicho-solto”, meus pais sempre trabalharam o
dia todo e nunca almoçavam em casa, ou seja era rua direto.
Prefiro as partes felizes, posso dizer que curti muito ser criança.